sábado, 20 de julho de 2019

Sobre a necessidade de homões da porra

O bode que eu tenho dessas problematizações sobre vidas de celebridades é que nossas discussões estão sendo pautadas pelos sites de fofoca e programas de entretenimento. A criação aos padrões estabelecidos ou a criação de novos modelos partir de pessoas públicas, cujas vidas a maioria de nós conhece a partir do filtro de suas assessorias de comunicação.
Critica-se a imprensa que insiste em nos empurrar um modelo de feminilidade "bela, recata e do lar", mas insistimos no mesmo erro ao procurar modelos de masculinidade ideal em atores globais ou hollywoodianos. Se o pessoal é político, nosso modo de pensar a política continua sendo de cima pra baixo, o que não é apenas estéril, como é perigoso.
Seja nas questões privadas ou na política institucional o debate permanece centrado no indivíduo. A direita está sabendo se aproveitar disso e na mentalidade liberal e meritocrática que a própria esquerda reproduz e não se dá se conta, porque é arrogante e se recusa fazer autocrítica.
De fato, é mais fácil insistir num discurso catastrófico e chantagista de que a esquerda precisa se unir em torno de uma candidatura salvadora que pensar outras formas de atuação política que escapem aos modelos já estabelecidos. O problema, ao meu ver, não é quem é o homão da porra, mas insistir que precisamos dele, seja lá quem for.

P.S. Escrevi esse texto há um ano. Era sobre o marido da Fernanda Lima e acabou virando outra coisa. Hoje as lembranças do FB me mostraram ele e já que resolvi reativar esse blog, vou aproveitar e colocar textos antigos que ficaram perdidos na TL.

sexta-feira, 19 de julho de 2019

A tour da beleza nunca será feminismo, eu tô nisso pelos likes

Eu ando meio obcecada nessa tour da beleza. Academia, cabelo, skin care. Em parte isso tem a ver com um imenso cansaço que eu tenho sentido do Brasil, da política e da vida em geral. Seguir rotinas de cuidados com a aparência me tira a vontade de chorar debruçada sobre os rejuntes do banheiro porque eu perdi o controle da minha vida.

Mas isso tem a ver também com o fato de que alguns meses farei 40 anos. Existe pressão estética relacionada ao envelhecimento, mas existe um peso que é viver em um mundo obcecado por juventude, sobretudo na área profissional que me sobrou, a comunicação. Na minha idade as pessoas nessa área são chefes. Eu estou num limbo de ter muita formação acadêmica e ser uma estagiária de 40 anos.

Eu nunca quis ser chefe na minha vida. Eu quis durante um tempo ser jornalista/escritora. E durante cinco anos incríveis eu fui a professora que eu queria ter tido na faculdade. Eu esperava fazer isso até morrer. Eu me imaginava pais e mães ex alunos perguntando pros filhos se eu ainda dava aula e se continuava doida. Eu pretendia ser uma professora velhinha surtada e treteira, mais ou menos do jeito que sou hoje, só que com um pouco de sabedoria.

Mas as coisas mudaram, o Brasil mudou e eu tenho vivido de frilas e contratos de trabalho precários desde então. Tentei uns concursos e não passei, mandei uns currículos e não me chamaram. Tudo bem, a vida é assim, não tá fácil pra ninguém, a gente se adapta. Eu já aceitei que a minha vida é assim agora, eu tenho outra profissão e contatos de pessoas que me mandam jobs. Mas é osso, sabe? Eu queria estar estabilizada ou pelo menos pelo saber se eu vou ter trabalho no mês que vem.

Eu brinco que eu sou o clichê da garota nerd que quando bota um batom e tira os óculos vira um mulherão, mas continua desastrada. Eu acho que o clichê cinematográfico pega a gente porque vende essa ideia de que se você ficar linda a sua vida vai mudar e tudo vai dar certo. Na falta de perspectivas e ausência total de vontade de discutir política na Internet eu me entrego ao cuidado com a aparência porque se tá tudo ruim eu preciso pelo menos me sentir gata, sabe.

Mas isso me deixa sempre um gostinho amargo, porque fico pensando no quanto é perigosa e recorrente a prática de indivíduos e marcas de politizar isso criando chavões como auto-cuidado e auto-amor e revestir isso de um discurso feminista. Mas esse é assunto pra outro textão.

sexta-feira, 5 de janeiro de 2018

Vivemos em uma sociedade que espera que adolescentes se portem como mulheres adultas e que mulheres adultas conservem a aparência de adolescentes. A consequência é que lidamos muito mal com o envelhecimento. O nosso e os dos demais.
Pensamos no envelhecimento parte da vida, mas como mera questão de aparência. Quando dizemos que alguém não aparenta a idade que tem estamos falando de rugas e quilos e não de maturidade, saúde, experiências vividas. Quando transcendemos a aparência, o assunto vira uma lista de tarefas que disseram que teríamos que cumprir, como casar, ter filhos.
Agimos como se as possibilidades da vida fossem acabar aos 30 anos, como se tudo tivesse que estar definido nesta idade. Não é difícil compreender porque pessoas mais jovens são tão ansiosas quanto à passagem do tempo e porque pessoas de trinta e poucos estão frustradas e deprimidas por não terem riscado todos os itens da lista de requisitos de como ser um adulto funcional padrão.
Esquecemos é que a vida pode terminar a qualquer momento. Toda vez que nos despedimos de uma pessoa querida pode ser a última vez que a vemos e pode ser a última vez que ela nos vê. Esquecemos também que a vida pode ser longa e que podemos ser para quem chega, a memória dos dias e daqueles que foram.
Hoje faz dois meses que eu perdi um amigo muito querido. Desde que ele se foi eu tenho tentado viver tendo o envelhecimento no horizonte, mas a fragilidade da vida levada no bolso. O passado me serve de memória afetiva e para aprender com meus erros. Mas é daqui pra frente. Sempre

sábado, 30 de dezembro de 2017

Cinco Dicas Para Parar de Ser Trouxa

Migas, vou dar um presente pra vocês usarem em 2018 que são essas Cinco Dicas Para Parar de Ser Trouxa, porque é impressionante o quanto as pessoas mentem pra si do mesmo jeito quando o assunto é macho.

1- "Quando a mulher quer ela muda um homem" é a mentira mais tóxica que existe e que só serve pra aprisionar mulheres em relacionamentos abusivos. Pare de achar que você é heroína e de querer encarar bucha só porque é difícil. Monte um quebra cabeça de duas mil peças ou escale uma montanha se o problema é falta de desafio.

2- Se a pessoa não está interessada ou não demonstra ter tanto interesse quanto você não caia nos dois extremos na trouxidão. São eles: 1) achar que é culpa sua 2) achar que com você será diferente. As pessoas nem sempre se interessam na mesma intensidade ou elas perdem o interesse antes. Isso é normal e, a menos que seja o primeiro crush da sua vida, você já passou por isso antes sendo a pessoa que não tinha ou perdeu o interesse. Aceita.

3- A culpa do cara ser um embuste é dele mesmo e da sociedade que passa pano pra machista. Não é sua e não é das outras mulheres que são fáceis ou são otárias. Inclusive quando você culpabiliza outra mulher pela conduta do seu macho, desculpa ser a pessoa que vai te avisar, mas você também tá sendo otária, miga. Porque não é a outra mulher que tá sendo pilantra contigo, é ele.

4- Se arrastar e se humilhar não traz ninguém de volta. Traz arrependimento, vergonha alheia e suas amiga dizendo que "não te avisei? " ou "se você continuar com ele não serei mais sua amiga porque não tenho amiga burra".. Como diz a Frozen, lerigou, miga. Isso não te pertence mais. Aceita e desapega.

5- Exceções geralmente servem para confirmar os padrões. Se você conhece alguma lenda urbana de um cara comprometido que terminou com a companheira pra ficar com a outra, passou quatro anos sem assumir uma relação e depois caiu em si e virou um marido exemplar, ou ainda, conheceu um piranho que quando "encontrou o amor" virou um cara que nem olha pro lado, lembre-se das dezenas de casos que você conhece de caras que ficam anos enganando esposa e amante(s), nos que passam anos enrolando alguém sem assumir nada até que a mina se cansa (e logo depois apareceu namorando sério) ou nos caras que nunca respeitaram seus acordos de não ficar com outras pessoas. Não caia na caia na cilada de achar que com você será diferente porque ele continua sendo o mesmo. Acredita na Marília Mendonça:ele não vai mudar.

BÔNUS 1: Se você não está sendo trouxa no momento, não pense que você é invulnerável. Isso não é algo que você possa prever, é algo que fazem com a gente e infelizmente nem mesmo quilos de feminismo conseguem retirar totalmente essa socialização românticadas mulheres héteras.

BÔNUS 2: Se sua amiga estiver sendo trouxa não a chame de burra ou a abandone. Ela vai precisar de apoio quando a casa cair e de incentivo pra quando decidir deixar o embuste. Esteja lá pra ela como ela ou outras estiveram lá quando você precisou.
P.S.Post heteronormativo porque é a experiência que eu tenho, não saberia escrever pra não-héteras e, além disso, não é meu lugar de fala.

segunda-feira, 19 de outubro de 2015

Breve história do mundo

Era uma vez Deus. Um dia, cansado de tanta pasmaceira Deus criou o universo, as coisas e as criaturas. Tudo exatamente do jeito que é hoje, com propriedade, com mercado, com Estado, com polícia, cadeia e pessoas dizendo que desde que o mundo é mundo as coisas são assim e nunca vão mudar.
Fim.

terça-feira, 13 de outubro de 2015

Sobre a série Narcos

Tem uma novela no Netflix chamada Pablo Escobar, o patrão do mal. A perspectiva é bem diferente, já que na versão do Padilha se fala do ponto de vista da DEA e na produção colombiana há uma ênfase na política local. A narrativa de Narcos, não linear e cheia de imagens de arquivo, além dos atores bonitões, é bem mais atraente. A colombiana é melodramática e cafona. Gosto porque sinto mais proximidade, me parece mais sulamericana.
Há incorreções históricas em ambas, mas o que de cara me chamou atenção é como as mulheres são retratas. Na novela colombiana, embora sejam minoria na trama, as mulheres são sujeito. A mulher que introduziu Pablo no tráfico de cocaína, Griselda Blanco nem é mencionada em Narcos; a mãe e a esposa do traficante são duas criaturas passivas que praticamente não têm voz e de modo geral as mulheres, como em Tropa de Elite, estão ali ou para: ser objeto sexual, gerar filhos, pra encher o saco, pra fazer besteira - que culmina em estupro e/ou morte.
Longe de mim querer protagonismo feminino no crime organizado. Mas é bem chato perceber que estamos em 2015 e as narrativas da cultura de massa insistam que tudo o que acontece no mundo é obra/consequência da ação de homens enquanto nós estamos lá apenas para servi-los.

sexta-feira, 21 de agosto de 2015

Deixem as minas malhar em paz

Eu vou à academia no horário de almoço, que é quando tem menos gente. Eu uso legging com uma camisetona larga pra chamar menos atenção possível. Mas hoje eu estava fazendo uma sequência de exercícios que exigia que eu ficasse de quatro no colchonete e eu não consegui terminar porque eu não tinha como me posicionar sem que desse ângulo pra três machos ficarem secando meu rabo. Desculpa se o meu linguajar ofende. Eu tô mais ofendida de não poder me exercitar em paz. Tem horas que é impossível não ser misândrica. 

Antes que alguém revire os olhos pensando: afe, acha que todo mundo tá olhando pra ela eu devo dizer que não é elogio nenhum ter seu corpo encarado por estranhos quando você está tentando se exercitar. Isso não faz com que eu me sinta bonita. Ao contrário, a gente se sente um lixo. Porque não precisa estar dentro dos padrões do que a sociedade considera bonita. Você é mulher e isso faz com que os homens se sintam no direito de te olhar como um pedaço de carne e não tenham a decência de disfarçar. Pelo contrário. É tão incômodo que você está de costas e sente que estão te comendo os olhos. Comendo, não. Violando.

A situação foi tão incômoda que eu acabei pedindo que a professora mudasse meu treino pra que eu não tivesse que ficar naquela posição de novo. Eu sei que eu estava num ambiente em que nada me aconteceria, eu sei que olhar não tira pedaço. Mas a raiva de saber que tem um estranho olhando pra você ostensivamente num ângulo e numa posição que em geral as pessoas só tem acesso em momentos de intimidade era tanta que eu não consegui terminar a série. As academias são cheias de anúncios para guardarem os pesos e utilizarem toalhas. Deveria ter cartazes para educar os homens também. É por causa disso que existem academias só para mulheres. Os homens tornam a vida tão insuportável que a gente tem que se cobrir e se auto-segregar.

Uma vez eu falei sobre assédio num post no Facebook e um amigo, que eu acredito que é uma pessoa bem intencionada, comentou: veja pelo lado bom, pelo menos você ainda chama atenção. Eu respondi muito educadamente sobre o quanto esse tipo de ideia é cagada. Eu tenho 35 anos, então ainda chamar atenção nessa idade, numa sociedade obcecada pela juventude, deveria ser uma vantagem. Continua-se acreditando que o único objetivo da vida das mulheres é atrair atenção dos homens. A última coisa que uma mulher quer é chamar atenção de estranhos. Ao contrário. A gente se cobre porque se culpa, porque sabemos que se formos vítimas de algum tipo de violência vão apontar o dedo pra gente e não pro agressor. Ser mulher é viver com medo.

Eu sou uma mulher vaidosa e em muitos momentos bem perua. Gosto de usar vestidos, decotes, mostrar as pernas, posto fotos em que me acho gata. Mas nas fotos que posto sou eu quem escolhe o que mostrar e de que ângulo eu quero que me vejam e quando eu me visto com roupas que mostram meu corpo estou fazendo isso pra mim, não pros outros. Não é possível que não dê pra entender a diferença. Mesmo assim eu tenho que pensar mil vezes antes de sair de casa porque se for pegar transporte público eu acabo pondo um short por baixo ou pondo uma calça).

Eu que tinha acordado de ótimo humor, saí da academia espumando de ódio. E triste, porque fui eu que tive que mudar, já que eu não poderia bater em cada um daqueles caras, como era minha vontade. Porque um dos motivos pelos quais eu malho é justamente ser forte. Porque se um cara tentar encostar a mão em mim sem o meu consentimento ele vai apanhar. Mas tem essas situações em que a pessoa não te toca, mas é abusiva mesmo assim. E quanto a isso a gente não sabe o que fazer, além de vir pra casa chorando e se rematricular no muay thai.