sexta-feira, 21 de agosto de 2015

Deixem as minas malhar em paz

Eu vou à academia no horário de almoço, que é quando tem menos gente. Eu uso legging com uma camisetona larga pra chamar menos atenção possível. Mas hoje eu estava fazendo uma sequência de exercícios que exigia que eu ficasse de quatro no colchonete e eu não consegui terminar porque eu não tinha como me posicionar sem que desse ângulo pra três machos ficarem secando meu rabo. Desculpa se o meu linguajar ofende. Eu tô mais ofendida de não poder me exercitar em paz. Tem horas que é impossível não ser misândrica. 

Antes que alguém revire os olhos pensando: afe, acha que todo mundo tá olhando pra ela eu devo dizer que não é elogio nenhum ter seu corpo encarado por estranhos quando você está tentando se exercitar. Isso não faz com que eu me sinta bonita. Ao contrário, a gente se sente um lixo. Porque não precisa estar dentro dos padrões do que a sociedade considera bonita. Você é mulher e isso faz com que os homens se sintam no direito de te olhar como um pedaço de carne e não tenham a decência de disfarçar. Pelo contrário. É tão incômodo que você está de costas e sente que estão te comendo os olhos. Comendo, não. Violando.

A situação foi tão incômoda que eu acabei pedindo que a professora mudasse meu treino pra que eu não tivesse que ficar naquela posição de novo. Eu sei que eu estava num ambiente em que nada me aconteceria, eu sei que olhar não tira pedaço. Mas a raiva de saber que tem um estranho olhando pra você ostensivamente num ângulo e numa posição que em geral as pessoas só tem acesso em momentos de intimidade era tanta que eu não consegui terminar a série. As academias são cheias de anúncios para guardarem os pesos e utilizarem toalhas. Deveria ter cartazes para educar os homens também. É por causa disso que existem academias só para mulheres. Os homens tornam a vida tão insuportável que a gente tem que se cobrir e se auto-segregar.

Uma vez eu falei sobre assédio num post no Facebook e um amigo, que eu acredito que é uma pessoa bem intencionada, comentou: veja pelo lado bom, pelo menos você ainda chama atenção. Eu respondi muito educadamente sobre o quanto esse tipo de ideia é cagada. Eu tenho 35 anos, então ainda chamar atenção nessa idade, numa sociedade obcecada pela juventude, deveria ser uma vantagem. Continua-se acreditando que o único objetivo da vida das mulheres é atrair atenção dos homens. A última coisa que uma mulher quer é chamar atenção de estranhos. Ao contrário. A gente se cobre porque se culpa, porque sabemos que se formos vítimas de algum tipo de violência vão apontar o dedo pra gente e não pro agressor. Ser mulher é viver com medo.

Eu sou uma mulher vaidosa e em muitos momentos bem perua. Gosto de usar vestidos, decotes, mostrar as pernas, posto fotos em que me acho gata. Mas nas fotos que posto sou eu quem escolhe o que mostrar e de que ângulo eu quero que me vejam e quando eu me visto com roupas que mostram meu corpo estou fazendo isso pra mim, não pros outros. Não é possível que não dê pra entender a diferença. Mesmo assim eu tenho que pensar mil vezes antes de sair de casa porque se for pegar transporte público eu acabo pondo um short por baixo ou pondo uma calça).

Eu que tinha acordado de ótimo humor, saí da academia espumando de ódio. E triste, porque fui eu que tive que mudar, já que eu não poderia bater em cada um daqueles caras, como era minha vontade. Porque um dos motivos pelos quais eu malho é justamente ser forte. Porque se um cara tentar encostar a mão em mim sem o meu consentimento ele vai apanhar. Mas tem essas situações em que a pessoa não te toca, mas é abusiva mesmo assim. E quanto a isso a gente não sabe o que fazer, além de vir pra casa chorando e se rematricular no muay thai.